terça-feira, 17 de junho de 2014

Ah, é sim... - A memória virtual, atual e o ofício do historiador




Estupefatos com a notícia da última semana, de que o presidenciável Aécio Neves impetrou – sabe-se lá como – um mandato de busca e apreensão dos computadores do PPGHIS da UFRJ, inclusive com uma queixa-crime por difamação direcionada à diretora da unidade, a profa. Mônica Grin Monteiro de Barros, esse blog gostaria de fazer algumas reflexões esparsas, quase ao leu.

Aqui já mencionamos em outros momentos a importância de o historiador se dar conta o quanto antes da singularidade tecnológica das fontes históricas que pesquisará no futuro (http://quemquerciencia.blogspot.com.br/2012/05/o-historiador-externinador-do-futuro.html). Agora gostaríamos de chamar a atenção para a singularidade do referido episódio envolvendo um personagem no mínimo controverso da política brasileira. A atitude do Senador da República pode ser compreendida como mais uma tentativa deliberada de manipulação da memória virtual. Pra quem já quis proibir o Google de mostrar predicados “não aconselháveis” de sua figura “controversa”, agora nos vemos atônitos com mais essa notícia. Convido o querido leitor a entrar agora no google, e digitar a palavra Aécio Neves, e esperar as relações propostas pelo site ao termo (escolhidas de acordo com o histórico dessas associações feitas por todos os que se prestaram ao mesmo ato, por ordem de relevância das mesmas). "Aécio Neves bêbado", "Aécio Neves corrupção", são os primeiros. Acha mesmo que um presidenciável vai querer isso? 

Pra que o leitor entenda direito: há uma milícia virtual a serviço desse representante seu – e meu – que monitora – pra não dizer censura – o conteúdo sobre ele postado na rede mundial de computadores. Os que emitem opiniões negativas sobre ele, são caçados, cerceados, ameaçados, sem critérios, sem eira-nem-beira. Especialmente porque a legislação que rege tais atividades ainda não foi suficientemente arregimentada. Ou seja, em terra de ninguém, quem sabe fazer usucapião é dono.

É fundamental que a sociedade se dê conta dessa manipulação explícita da memória, realizada nesse caso em sua instância virtual. Não vamos entrar aqui em nenhum mérito político. Não temos nada contra o excelentíssimo Senador. Afinal, vivemos em uma democracia, conceito e princípio tão esquecido nos últimos tempos. Todos, temos o direito de nos expressar, expressar nossas opiniões, de ter acesso à informação, etc. A atitude do Senador Aécio Neves é um alerta aos historiadores, que fazem da memória um instrumento de análise, de inserção profissional, de trabalho enfim.

Não sejamos inocentes a ponto de pensar que tal manipulação memorial nunca tenha ocorrido. É evidente que não. Quem vive num país forjado pelas Organizações Globo não pode ser inocente a esse ponto. Ainda mais quem vive ou viveu em Minas, e vê, lê, escuta e sente tal manipulação em todos os mecanismos de imprensa. O passo dado pelo presidenciável Aécio Neves vai além. Tenta chegar num terreno até então “democrático”, da rede mundial de computadores. Tenta escarafunchar e censurar os que supostamente difamam a imagem – ilibada, pura, casta, irrepreensível, magnânima, auspiciosa, brilhante como louça de propaganda da Bombril – desse cidadão. É mais do que certo também que essa “democracia” romantizada na internet já foi pro espaço há muito tempo. Não se trata disso. Investe-se milhões em maneiras de controla-la cada vez mais, especialmente porque crimes graves são cometidos aqui. E, claro, tais crimes precisam ser punidos. A questão é que não existem critérios estabelecidos quando a questão é de “opinião”. E aí mora o x da questão. Se não há critérios, haverá gente esperta fazendo bom uso de sua esperteza!  

Antes de qualquer coisa, fica aqui nossa solidariedade aos colegas do PPGHIS da UFRJ. Fica também o convite à reflexão sobre a singularidade da profissão histórica no século XXI. Pensar em memória não pode mais ser algo feito à base dos textos “memoráveis” de Le Goff e Pierre Nora. Não! A memória é construída num processo temporal e socialmente fluido demais. A dimensão do futuro precisa ser incorporada à ela. O caso do personagem Aécio Neves deixou isso límpido como água, pra quem quiser ver.

E ainda é importante pensar: isso porque ainda estamos na campanha eleitoral!

Quem disser que isso não se parece com a censura ditatorial, que tanto nos marcou, convido a assistir ao vídeo abaixo. Ele seria possível em um contexto democrático, na acepção do termo?



Chico Buarque de Holanda, pra citar apenas um raso exemplo, já havia nos brindado com verdadeiras pérolas da música brasileira no contexto ditatorial. Ironia, jogos de palavras, humor, etc., passavam uma mensagem quase subliminar, que misturava arte e crítica ácida a um regime cerceador de mentes e corpos. A semelhança, por mais anacrônica que possa parecer a princípio, precisa ser considerada. No mínimo.

Agora, discuta conosco: vc acha que a memória virtual é manipulada, controlada sabe-se lá por quem? Ah, é sim!... Te dá medo pensar nisso? Então, pensemos em conjunto, DEMOCRATICAMENTE, soluções para o problema!

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